“Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas – a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra coisa todos os dias são meus”.
O trecho é de um poema de Alberto Caiero, um dos heterônimos de Fernando Pessoa (1888-1935), o famoso poeta português de cuja obra a professora e escritora Cleonice Bernardinelli (Cleonice Serôa da Motta Berardinelli), que morreu neste 31 de janeiro aos 106 anos, era especialista – uma das maiores do mundo.
A professora Cleonice era, desde 2009, membro da Academia Brasileira de Letras, onde ocupava a cadeira número 8. Graduada em Letras, foi professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, entre outros cargos que exerceu durante sua longa existência. Era, também, especialista em Camões.
Há quase sessenta anos, Cleonice Berardinelli ministrou, em Curitiba, a alunos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFPR, um curso sobre literatura portuguesa, do qual, como acadêmico de Jornalismo, fui um dos alunos.
O trecho do poema de Alberto Caiero foi tirado da apostila relativa à terceira aula do curso – foram cinco no total. Naquela semana, fomos por ela apresentados a nomes de destaque da literatura portuguesa: Mário de Sá Carneiro, Miguel Torga, Eugênio de Castro, Camilo Pessanha, Teixeira de Pascoais, Ronald de Carvalho, Alfredo Pedro Guisado, Armando Cortes-Rodrigues, José Régio.
E, naturalmente, a Fernando Pessoa e a seus três heterônimos mais conhecidos: Alberto Caiero, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Pessoa os tinha às pencas – mais de vinte, em diferentes estilos.
Todos esses nomes e uma pequena parte de sua obra repousam nas páginas já amareladas da apostila que recebi, há quase seis décadas, da professora Cleonice.
Um privilégio.