Prefeito, que tal uma caminhada pelo calçadão?

Rua das Flores, o calçadão perdeu o charme

Gostaria de sugerir ao prefeito Rafael Greca uma caminhada vagarosa pela rua 15 de Novembro, principalmente no trecho chamado das Flores. Da Presidente Farias à Boca Maldita. Aquele mesmo que ele ajudou a lavar um pedaço nas primeiras semanas de gestão. Vai ficar horrorizado.

Greca é um profundo conhecedor de Curitiba. Gosta muito da cidade. Fez uma primeira gestão (1993-1996) brilhante, aproveitando o legado de Jaime Lerner.

Deixou sua marca em obras comemorativas aos 300 anos oficiais da urbe, que, na verdade, é muito mais velha: segundo as anotações do professor e historiador Júlio Estrela Moreira, baseadas nas “Memórias Históricas do Rio de Janeiro”, de José de Sousa Azevedo Pizarro (1753-1830), “a criação de Curitiba foi feita pelo Capitão das Canoas de Guerra Ébano Pereira, em 1654”. O local ficava às margens do rio Atuba e era chamado “Vila Velha”.

Antes de sua elevação à categoria de Vila, em 29/3/1693, com a instalação da Câmara de Vereadores, que é a data comemorada anualmente, Curitiba ganhou a instalação do Pelourinho, símbolo da Justiça, em 1668. Em 1842, foi alçada à condição de cidade; em 1853, com a criação da Província do Paraná, ficou sendo a capital.

Alguns trechos da 15 ainda se salvam da poluição

O passeio do alcaide teria o dom de lhe mostrar que Curitiba parece estar trilhando o caminho inverso. Involuindo. Voltando àqueles tempos primitivos. Não é culpa exclusiva de sua administração: Greca fechou, há duas décadas, o ciclo de prefeitos criativos da capital, cuja marca ficou patente desde os tempos de Ney Braga (1954-1958) e avançou com seus sucessores até quase o final do século 20.

Antes de Ney Braga, Curitiba teve exemplares dispersos de grandes administradores, como Cândido Ferreira de Abreu, eleito em 1892, que voltaria nomeado em 1913, criando uma Comissão de Melhoramentos, embrião de um plano de urbanização (construiu também o Paço da Liberdade, há 101 anos); João Moreira Garcez, que ficou 10 anos no cargo, em três gestões; Rozaldo de Mello Leitão, que encomendou o Plano Agache de urbanização ao arquiteto francês Alfredo Agache; Alexandre Beltrão, seu sucessor, que começou a implantar as primeiras obras do plano; e Erasto Gaertner, médico de conceito, que trouxe para Curitiba a primeira usina de asfalto. Teria sido governador; morreu precocemente.

Há outros bons nomes, mas de mandatos curtíssimos, esquartejados pelos interesses políticos de cada época, que pouco puderam fazer.

O século 21 ainda não viu expressões administrativas no Palácio 29 de Março. O antecessor de Greca, Gustavo Fruet, bom parlamentar, em quem votei nos dois turnos de 2012, foi um desastre, o que levou o eleitor a alijá-lo do segundo turno em 2016. Ficou em terceiro, atrás de Greca e Ney Leprevost.

Em sua caminhada, o prefeito poderia se fazer acompanhar do seu secretário de Urbanismo e lhe mostrar as aberrações que acontecem no calçadão. Num rápido passeio por ali, dias atrás, contei serviço de som em alto volume em oito lojas comerciais, o que faz Curitiba parecer a mais atrasada das cidades do interior.

Em vários pontos, músicos desafinados, também com caixas de som que atormentam os passantes e muito mais quem por ali trabalha. Alguns deles, com uma cantilena de hinos religiosos. Os músicos foram autorizados por decreto na gestão anterior, mas deveria haver uma seleção para evitar o mau gosto e não agredir o ouvido nem a paisagem.

O titular do Urbanismo poderia testemunhar, ainda, que muitas lojas voltaram a colocar suas placas perpendiculares à parede, o que havia sido proibido desde uma despoluição visual de décadas passadas.

No calçadão, ciclistas passam em alta velocidade, ameaçando a integridade física dos pedestres; bicicletas são amarradas às floreiras (Fruet fez lugar especial para elas em alguns locais, mas quase ninguém usa). Lixo na rua. Pipoqueiros, vendedores de caldo de cana, de tapioca, ambulantes. Carrinheiros. Homens-placa chamando para restaurantes. Até uma farmácia montou um portal inflável bloqueando parte do passeio. Tudo bem, todos precisam faturar em tempos de crise econômica, mas a cidade não pode pagar por isso.

Na Boca Maldita, o ponto da Linha Turismo está sempre ocupado por outros veículos. Ninguém respeita, ninguém faz nada. O prefeito poderia, também, ciceronear seu secretário de Trânsito no passeio. Parece que o pessoal da Prefeitura não circula a pé pela cidade; só usa carro oficial, margeando os problemas.

E se o petit pavê do calçadão é tombado, como se permite que algumas lojas façam verdadeiras forrações com papel colorido para apregoar suas promoções? E se é tombado, não seria o caso de a Prefeitura manter uma equipe (pequena) de calceteiros de qualidade, só para os consertos?

Curitiba está precisando urgentemente de um choque de competência. O prefeito é bom, já provou isso. Mas as alianças políticas que lotearam a Prefeitura o fizeram se cercar de muita gente que não acompanha o seu ritmo.

E que está precisando de um sonoro puxão de orelhas.

 

 

 

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