Curitiba: três eleições para prefeito entre duas ditaduras

Ney Braga: primeiro prefeito eleito de Curitiba após a redemocratização do país, ao fim da ditadura de Vargas/foto: acervo de família

Entre duas ditaduras – a de Getúlio Vargas, deposto em 1945, depois de governar o país por 15 anos, quando liderou um golpe batizado de Revolução de 1930, e a dos governos militares, que durou 21 anos (1964-1985) – Curitiba teve apenas três prefeitos eleitos pelo voto direto da população: Ney Aminthas de Barros Braga, Iberê de Mattos e Ivo Arzua Pereira.

Apesar da volta do regime democrático, que culminou com a eleição do marechal Eurico Gaspar Dutra à presidência da República, em 2 de dezembro de 1945, o pleito direto já constando na Constituição Federal, em Curitiba os prefeitos continuaram a ser nomeados pelo governador e a cidade ficou à mercê de uma série de ocupantes-relâmpagos instalados no Paço Municipal.

Até que a Constituição do Paraná, que continuava delegando ao governador o poder da nomeação de prefeitos da Capital e de municípios considerados de segurança nacional, definiu, através de emenda, a primeira eleição pós-ditadura para 1953. Mas nem assim o novo prefeito foi escolhido naquele ano.

É que 1953 marcava o centenário da Emancipação Política do Paraná, em 29 de agosto de 1853, resultado da Lei Imperial nº 704, sancionada pelo imperador d. Pedro II, – o 19 de dezembro é a data da instalação da província -, libertando-o do jugo de São Paulo, do qual era Quinta Comarca. Como a campanha eleitoral poderia prejudicar os festejos dos 100 anos, os políticos de então decidiram, em comum acordo, adiar o pleito para o ano seguinte.

Nessa transição, os últimos prefeitos nomeados pelo governador Bento Munhoz da Rocha Neto que ficaram mais tempo no cargo foram Erasto Gaertner (cerca de 16 meses), José Luiz Guerra Rego (10 meses) e Ernani Santiago de Oliveira (sete meses, encerrados ao fim do período eleitoral com a posse do eleito).

Assim, em 3 de outubro de 1954, os 97.240 eleitores de Curitiba deveriam comparecer às urnas, que eram uma espécie de sacolões de tecido grosso, com uma fenda para depositar o voto. Mas foram registrados apenas 64.210 votantes, com 33.030 abstenções. Era uma eleição chamada de ‘solteira”, só para prefeito: os vereadores seriam eleitos em 1955.

Concorriam oito candidatos: Ney Braga, Wallace Thadeu de Mello e Silva (pai de Roberto Requião), Alfredo Pinheiro Junior, Estevam Ribeiro de Souza Neto, Amâncio Moro, João Cid Portugal, Roberto Barrozo e Manoel de Freitas Aranha.

Ney Braga, major do Exército, ex-chefe de Polícia (cargo hoje equivalente a secretário de Segurança Pública) foi eleito com 18.327 votos (29,96% dos votos válidos; ainda não havia a necessidade da maioria absoluta); Wallace ficou em segundo, com 11.576 votos; Pinheiro Junior, em terceiro, com 11.070 votos; Souza Neto, 8.007; Moro, 5.213; Portugal, 4.567; Barrozo, 1.307; e Aranha, 1.101 votos.

Ney Braga, empossado em 15 de novembro de 1954, governou a cidade por quatro anos, modernizando procedimentos, construindo a estação rodoviária (hoje Terminal Guadalupe), o Mercado Municipal, e instituindo as áreas seletivas para o transporte coletivo, organizando o setor, onde, até então, cada dono de lotação (pequenos ônibus) fazia o que bem entendia. Entre muitas obras de pavimentação.

Iberê de Mattos: vitória na terceira zona/foto: reprodução

Com uma gestão muito elogiada pelo curitibano, Ney Braga tinha tudo para fazer o sucessor em 3 de outubro de 1958. Mas isso não aconteceu. Como seu candidato, ele indicou o vereador Felipe Aristides Simão; os outros eram: Iberê de Mattos, Luiz Carlos Pereira Tourinho, novamente Wallace Thadeu de Mello e Silva e João Pereira de Macedo. Os eleitores já eram 104.213 e foram registrados 89.683 votos válidos, 3.124 em branco e 4.126 nulos, com 7.280 abstenções.

Iberê de Mattos, general do Exército, que havia sido diretor da rede ferroviária Paraná/Santa Catarina, ganhou as eleições com 32.313 votos (34,82%), seguido de Felipe Simão, com 26.691 votos; Tourinho, 16.690; Wallace, 11.554; e Macedo, 2.436.

O interessante nesta eleição é que, ao longo da apuração, Simão liderava com alguma folga e seus correligionários já comemoravam. Até a abertura da terceira zona (na época, eram apenas quatro zonas eleitorais em Curitiba), reduto de Iberê, que virou a contagem e foi eleito, tomando posse em 15 de novembro daquele ano.

Em 1962, a eleição foi realizada também num 6 de outubro, como hoje, mais uma vez apenas para prefeito. Com apenas três candidatos: Ivo Arzua Pereira, indicado por Ney Braga; Carlos Alberto Moro, cujo pai, Amâncio, havia sido prefeito por cinco meses, em 1951, nomeado pelo governador Moisés Lupion; e Abílio Ribeiro, figura bastante atuante da vida paranaense (quando estudante, foi um dos criadores do famoso Chá Dançante de Engenharia), ex-presidente do Atlético Paranaense, anos depois diretor do Departamento de Trânsito, entre outras funções.

Ivo Arzua: mais ação e menos conversa/foto: acervo IEP

Ivo Arzua, engenheiro de temperamento reservado, que havia sido superintendente do Porto de Paranaguá e administrador das obras do Centro Cívico, em Curitiba – cuja campanha adotou o mote “Mais ação e menos conversa” – foi o eleito, recebendo 51.511 votos (47,38%); em segundo, Carlos Alberto Moro contabilizou 40.187 votos; Abílio ficou em terceiro, com 17.023. Eram 144.571 os eleitores registrados; foram 108.721 os votos válidos, 4.200 os em branco e 8.102 os nulos.

Arzua tomou posse em 15 de novembro de 1962 e cumpriu quatro anos de gestão, que foram prorrogados por quase mais quatro meses, por ato do governador Paulo Pimentel, até ser nomeado ministro da Agricultura no governo do general Arthur da Costa e Silva, o segundo do regime militar.

Curitiba só voltaria a conhecer um prefeito eleito pelo voto direto em 1985, quando Roberto Requião de Mello e Silva – filho de Wallace, derrotado duas vezes para o cargo – venceu o arquiteto Jaime Lerner por estreitíssima margem de votos.

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