Aqueles que dedicam longas horas a curtir temporadas de seriados oferecidos via ‘streaming’ ficariam surpresos se reservassem alguns instantes a pesquisar como foi a chegada da televisão aos lares. E, hoje, apenas em museus podem conhecer aquela parafernália que exigia muito esforço para ser manipulada, câmeras imensas que podiam pifar a qualquer momento, interrompendo uma programação que era ao vivo.
O vídeo-tape que permitiria gravar os programas só chegou bem mais tarde. E, a partir de então, para levar aos telespectadores as cenas de uma novela, as emissoras locais recebiam, quase que diariamente, das redes às quais eram afiliadas, aqueles imensos carretéis blindados onde os capítulos estavam gravados.
A primeira emissora de TV do Brasil – a Tupi de São Paulo – foi inaugurada em setembro de 1950, obra do visionário Assis Chateaubriand, que semeou congêneres pelo Brasil. Mas, no Paraná, a empresa de Chatô perdeu para a ousadia de outro pioneiro – o empresário de rádio Nagibe Chede Abrahão – que fundou a TV Paranaense/Canal 12 (hoje RPC), cujas primeiras imagens, em caráter experimental, foram ao ar em julho de 1954. Em circuito fechado, puderam ser assistidas em aparelhos de TV instalados nas vitrines da loja Tarobá, na esquina da avenida João Pessoa (hoje Luiz Xavier) com rua Voluntários da Pátria. A TV seria oficialmente inaugurada em outubro de 1960.
Conta o jornalista Sandro Dalpícolo em seu livro
“Uma nova luz na sala/Histórias da TV Paranaense”, que Renato Mazânek “dava os primeiros passos na carreira de radialista, quando assistiu ao show, pelos aparelhos de tevê que estavam na esquina, em frente à praça Osório, naquela noite. ‘Foi espetacular, ficou todo mundo extasiado’, disse ele. Mazânek conta que a qualidade da imagem era boa e impressionava quem só tinha ouvido falar do tal invento. ‘A reação era abobalhada. Eu não sabia o que estava acontecendo, não dava para entender, eu não sabia o que ia acontecer’”.
Pouco depois, e ao longo de décadas, Mazânek seria um dos principais profissionais a garantir a entrada no ar e a qualidade da TV no Paraná.
No livro “A pequena notável”, sobre a trajetória da revista TV Programas que criaram para divulgar a programação das TVs e registrar fatos do segmento, os jornalistas Luiz Renato Ribas Silva e Célio Heitor Guimarães, lembram que as transmissões iniciavam diariamente às 18 horas, indo até à meia-noite; depois passaram a começar ao meio-dia. “O sonho de Nagibe Chede se materializara. Curitiba e o Paraná tinham, enfim, a sua televisão. Restava apenas aperfeiçoá-la. (…)
“Nessa caminhada – destacam – um nome deve ser realçado, o de Renato Mazânek, não apenas por ter sido testemunha ocular da história, mas por ter participado dela, ou seja, tê-la ajudado a formar-se. Mazânek sempre foi um curioso”. Trabalhava na Rádio Emissora Paranaense, de Nagibe Chede, quando foi convocado a substituir um diretor de programa que havia faltado. “Chamem o Renatinho! – berrou Nagibe”, que conhecia as qualidades do funcionário.
E assim começou a carreira de Mazânek na TV, aprendendo fazendo, solucionando sérios problemas com sua criatividade. Quase sempre agindo nos bastidores.
Autor de “Pequenas histórias de grandes talentos/Os primeiros passos da Televisão no Paraná”, o homem de rádio e TV Jamur Júnior diz que “Renato era uma espécie de fac totum: operador de som, ator, humorista, diretor. Chede escalou Renato para colaborar com Olavo Bastos nas transmissões, geradas no improvisado estúdio do 20º andar do edifício Tijucas. Aplicado, Mazânek recebeu de Olavo as primeiras letras sobre um assunto que lhe era inteiramente desconhecido: como ‘cortar’ um programa de TV. (…) A partir daí, Renato foi descobrindo a televisão. Sem ninguém para lhe dar explicações didáticas sobre como fazer. Renato descobriu por si próprio”.
Em sua obra “Em preto e branco, o início da televisão em Curitiba”, a pesquisadora e mestre em História Maria Luiza Gonçalves Baracho, relata: “Improvisação e experimentação eram frequentes, porque informações sobre máquinas, técnicas, linguagens e formas de fazer televisão eram escassas. Para muitos daqueles pioneiros, como Mazânek, que dedicava horas incontáveis para tirar dos equipamentos os melhores efeitos, havia momentos em pensavam em desistir”. E cita as dificuldades enfrentadas por Renato e seu desabafo: “Tanto no rádio quanto na televisão, eu tive que ser um autodidata”.
Em seu “Ondas curta e média sem delonga/O rádio que eu ouvi e vivi”, Renato Mazânek conta parte de sua caminhada, desde os idos dos anos 1940, quando acompanhava o pai professor e, como aluno de latim, conheceu um colega, Nicolau Nader, que era locutor da Rádio Marumby e que mais tarde o convidou a trabalhar com ele numa rádio que estava sendo criada, a Difusora Ouro Verde: “Aquela noite passei em claro. Da mais pura alegria. Estávamos em meados de outubro de 1955, data em que selou, definitivamente, a minha vida profissional”.
Em “Pequenas histórias de grandes talentos”, Jamur Júnior faz um breve perfil de Renato: “Paranaense de Rio Negro, nascido em 13 de agosto de 1938, filho de Luiz Mazânek e de Rosália Chichoski Mazânek. Iniciou sua carreira profissional na Difusora Ouro Verde, como locutor e operador de som. Atuou em rádio-teatro e programas humorísticos da Rádio Colombo, onde acumulou a função de chefe de operadores. Em 1959, atendendo convite de Nagibe Chede, assumiu a direção das rádios Curitibana e Emissora Paranaense e, em seguida, foi designado para acompanhar a montagem da TV Paranaense Canal 12, onde foi responsável pelo treinamento da primeira equipe operacional e foi o primeiro diretor de TV.
“Criou e produziu os primeiros comerciais filmados e sonoros no Paraná, utilizando equipamento do principal produtor de cine-jornais, Eugênio Félix. Na mesma época, foi diretor comercial da Rádio Guairacá. Ocupou essa mesma função na Rádio Clube Paranaense e nas televisões Iguaçu, de Curitiba, e Tibagi, de Apucarana. Em 1975, deixou a televisão para se dedicar à propaganda. Foi diretor de Atendimento da Múltipla Propaganda e posteriormente criou sua própria empresa, a Teorema Propaganda Ltda”.
Ao longo de sua vida, Renato nunca deixou de ser um sonhador, uma espécie de D. Quixote. Cutucava prefeitos, governadores, ministros e até presidentes da República com suas cartas de sugestões. Projetos que ele sugeriu acabaram acontecendo, não em atendimento às suas propostas, mas porque eram viáveis.
Além da competência com que enfrentava e resolvia os problemas dos jurássicos equipamentos da época, era um homem de ideias, ao que somava, às vezes, uma certa teimosia, sem deixar de lado a cortesia e a simpatia. Foi uma das pessoas mais íntegras que conheci. Ao lado do também pioneiro Luiz Renato Ribas Silva, foi um dos realizadores do projeto Memória Paraná.
Renato Mazânek morreu neste sábado 3 de junho, em Curitiba, aos 85 anos de idade, em função de uma parada cardiorrespiratória. Foi velado pelas filhas e parentes e uma legião de amigos, em uma das capelas Vaticano e sepultado no cemitério Parque Iguaçu.
Deixou a quem fica e às novas gerações, a marca da ousadia e o timbre da competência.