Filho de um modesto funcionário público municipal, que ganhava salário mínimo e cumpriu uma jornada de 37 anos de trabalho, o vereador Herivelto Alves de Oliveira, do partido Cidadania, em seu segundo mandato na Câmara de Vereadores, assume nesta quinta-feira 30 de maio o cargo de prefeito municipal de Curitiba, em regime interino, por 10 dias.
Na verdade, o substituto do prefeito Rafael Greca, em viagem ao exterior, deveria ser o vice, Eduardo Pimentel Slaviero; na ausência deste, o presidente da Câmara, Marcelo Tschá Fachinello.
Pimentel vai à Barcelona, na Espanha, e a Milão e Turim, na Itália, para eventos técnicos sobre cidades. Em sua comitiva, como convidados, seguem o presidente da Câmara, o primeiro e o segundo vice, Tito Zeglin e Mauro Ignácio, respectivamente.
Pela ordem, deveriam assumir a Prefeitura, nesse caso, o primeiro, o segundo, o terceiro, o quarto secretário, o mais votado, e assim em sequência. Mas todos são candidatos à reeleição e ficariam impedidos de concorrer se ocupassem, mesmo por poucas horas, um cargo executivo. Sobrou, então, para Herivelto de Oliveira, que não tem lugar na mesa diretora, mas decidiu não tentar um terceiro mandato. O primeiro secretário da Casa, Osias Moraes, assume interinamente a presidência do legislativo.
E assim, no feriado de Corpus Christi, Herivelto passa a ocupar, por 10 dias, o gabinete principal do Palácio 29 de Março, no Centro Cívico. Lembrando do pai, diz: “Então, pra mim, é uma honra hoje chegar ao posto mais alto do funcionalismo municipal”, conforme declarações divulgadas pela assessoria de imprensa da Câmara.
Herivelto é jornalista. No passado, o Paço Municipal foi ocupado, em diferentes épocas, por alguns jornalistas: o prefeito Claudino dos Santos (1916-1917), que trabalhou no Diário de Notícias, do Recife, onde nasceu, e depois em A Federação, em Curitiba; Aluísio França (1937), que publicava poesias em jornais e criou uma revista literária, “Stellario”; José Luiz Guerra Rego (1953) não era jornalista, mas participou da fundação do jornal O Estado do Paraná como acionista.
Maurício Fruet (1983-1985) era mais radialista do que jornalista. Roberto Barrozo Filho, do Jornal de Curitiba/Jornal do Estado tentou, como presidente da Câmara, assumir a Prefeitura, num caso polêmico, onde contestava o direito do governador Bento Munhoz da Rocha nomear o prefeito. Foi um episódio que Curitiba praticamente teve dois prefeitos ao mesmo tempo. Roberto Requião (1985-1988) era jornalista diplomado mas nunca exerceu. Marcelo Fachinello, interino meses atrás, trabalhou em rádios, TV e em assessoria de imprensa.
Herivelto é considerado o segundo negro a assumir a Prefeitura de Curitiba. Antes dele governou a cidade, também interinamente, entre 16 e 20 de julho de 1948, o vereador e 1º vice-presidente da Câmara Antenor Pâmphilo dos Santos, que substituiu o então prefeito Ney Leprevost (avô do atual deputado homônimo) , que solicitou licença do cargo para acompanhar o tratamento de saúde de pessoa da família.
Antenor Pâmphilo dos Santos era baiano de Salvador. Atuou em sua cidade natal como agente de saúde, função que também exerceu em Curitiba. Aqui, diplomou-se em Farmácia e em Medicina. Foi professor da Faculdade de Medicina, que também dirigiu (em sua gestão foi inaugurado o Hospital de Clínicas de Curitiba), exerceu cargos importantes na área da saúde e foi secretário de estado da Educação.
Filiado ao antigo PSD (Partido Social Democrático), foi eleito vereador para as legislaturas de 1947-1950 e 1956-1959, chegando a primeiro vice-presidente da Casa. Estava no exercício da presidência quando foi chamado a substituir o prefeito. Morreu em Curitiba em 9 de fevereiro de 1967, aos 71 anos. (Dados extraídos do livro “Os nomes da placa/A História e as histórias do monumento à Colônia Afro-brasileira de Curitiba”, editado pela Fecomércio PR em 2021).
Herivelto Alves de Oliveira é curitibano e formado em Jornalismo pela UFPR, turma de 1987. Também é músico, como consta de seu perfil oficial. Foi repórter, editor e apresentador de telejornais na TV Paranaense (atual RPC) por 27 anos e depois na RICTV. Em 2017, criou um canal no Youtube – Brasil de Cor – para dar visibilidade aos negros.
Em 2016, filiado ao PPS (Partido Popular Socialista) candidatou-se a vereador em Curitiba, ficando como primeiro suplente do partido; assumiu a cadeira em 2019, substituindo o vereador Hélio Wirbiski. Em 2020, foi eleito pelo partido Cidadania (novo nome do PPS), com 6.441 votos.
A posse de Herivelto se dá em obediência ao artigo 69 da Lei Orgânica do Município: Em caso de impedimento do Vice-Prefeito ou de vacância do cargo, serão chamados ao exercício, respectivamente, o Presidente, o 1º Vice-Presidente e o 2º Vice-Presidente da Câmara Municipal, e, no caso de impedimento destes, serão chamados os demais membros da Mesa da Câmara, e, persistindo o impedimento, serão chamados, sucessivamente, os Vereadores mais votados.
Desde a primeira eleição para prefeito de Curitiba, em 1892, na qual o vencedor foi o engenheiro Cândido Ferreira de Abreu (e como há erros no Google a respeito de quem foi o primeiro eleito), o substituto eventual do prefeito era o vereador mais votado e, mais tarde, o presidente da Câmara. Em determinadas épocas, se a ausência do titular fosse inferior a 15 dias, o prefeito podia optar por indicar um substituto, que “respondia pelo expediente”.
O caso de Herivelto não é original em Curitiba e ocorreu em gestões anteriores, quando praticamente todos os vereadores eram candidatos à reeleição. O primeiro vice-prefeito de Curitiba, Adeodato Arnaldo Volpi, eleito indiretamente em 1964 pela Câmara, nunca substituiu o titular, Ivo Arzua Pereira; o cargo foi logo extinto porque os prefeitos passaram a ser nomeados depois do golpe militar daquele ano.
Entre o final de 1966 e 1985, ano em que Roberto Requião de Melo e Silva foi eleito, Curitiba só teve prefeito nomeado, sem vice; seu vice, Adhail Sprenger Passos, que havia sido vereador e deputado estadual, assumiu o cargo várias vezes. Desde então, os vices cumprem a rotina de substituir o titular, a não ser em casos excepcionais como o atual.
Nesses episódios de interinidade na Prefeitura de Curitiba, há um, insólito, em que o interino cumpriu praticamente um mandato inteiro. João Antônio Xavier, então o camarista (assim eram chamados os vereadores) mais idoso, substituiu o prefeito Claudino Rogoberto Ferreira dos Santos, que estava doente e acabou morrendo. Xavier assumiu várias vezes e acabou completando o mandato de Claudino, entre janeiro de 1917 e fevereiro de 1920, quando o novo titular – João Moreira Garcez – foi nomeado. Anteriormente já havia comandado a Prefeitura, entre o final da gestão de Joaquim Pereira de Macedo (1908-1912) e a segunda posse de Cândido de Abreu (1916-1916), ficando quatro meses no cargo.
Foi um superinterino, no total, com mandato até maior que muito titular.