O multitalentoso Mussa

Mussa: um mestre do jornalismo/foto: Reprodução/site Sindijor

Talvez não tenha havido – ou, se houve, foram muito poucos – na imprensa brasileira um jornalista tão completo, tão multitarefas, no dia-a-dia da profissão, como Mussa José Assis, que nesta quarta-feira 6 estaria completando 80 anos de idade. Exagero?

Mussa sabia reportar com competência, tinha um texto brilhante – começou a escrever para jornal aos 14 anos -, sabia paginar nos tempos remotos da paginação, sabia diagramar, editar, dirigir, fazia manchetes com maestria, era íntimo dos mistérios da rotativa – chegou a desenhar detalhes de uma para O Estado do Paraná, que dirigiu por longos anos -, entendia dos meandros da clicheria, das artes de compor frases nas velhas linotipos alimentadas a chumbo e a resolver problemas imprevistos em qualquer área.

E foi competente ao aceitar os novos tempos: da aposentadoria das jurássicas Remingtons e Olivettis, do advento das pioneiras composers, do past-up (a página diagramada com as tiras dos textos compostos, no tamanho padrão e depois em escala, ampliada na fotolitagem), da constante evolução desses processos, dos modernos computadores e das redações enfim silenciosas. Sempre soube se reinventar ao longo de mais de meio século de profissão.

Mussa, que morreu em 21 de fevereiro de 2013, duas semanas antes de completar 69 anos – era um bom fumante e, antes de ingressar na UTI, já desenganado em razão dos graves problemas no pulmão, pediu uma última tragada -, será homenageado esta noite por uma legião de amigos, colegas e discípulos, num encontro no histórico Bar Palácio, em Curitiba (r. André de Barros, 500), um cenário que, em seu endereço original da Barão do Rio Branco, foi pouso obrigatório da turma da imprensa.

Cidadão Honorário de Curitiba e do Paraná, Mussa José Assis, filho de libaneses – José e Rajah Quirilos Assis -, último de 13 filhos, nasceu em Pompeia (SP), cidade que homenageou, anos mais tarde, com o pseudônimo de Roberto Maria de Pompeia, que usou nos tempos da ditadura. Estudou em Tupy Paulista e no colégio dos padres salesianos em Lucélia, também pertencente ao mapa de São Paulo.

Em determinado momento, pensou ser padre; sua imaginada vocação o levou longe: um seminário dos capuchinhos na gaúcha Veranópolis. Ali, aprendeu latim, grego, francês e italiano. E aprimorou o português. A fluência em latim garantiu-lhe, anos depois, um cargo de professor da matéria no Colégio Estadual do Paraná, onde estudou ao chegar em Curitiba, em 1958, depois de cumprir o necessário exame de admissão, uma espécie de vestibular para ingressar no então chamado ensino secundário. No Estadual, entre as turmas do Clássico – dedicado a quem pretendia a carreira jurídica – e do Científico – para a maioria das demais -, escolheu a última. Confessou, certa vez, que pretendia ser médico, outra vocação imaginada, substituída com inteligência e sucesso pela de jornalista. Com certeza, teria exercido o sacerdócio ou a medicina com a mesma seriedade e competência.

No Colégio Estadual, passou a editar um pequeno jornal do Centro de Estudos da instituição – o Cecep -, em conjunto com um colega, Newton Finzetto, filho do histórico homem de rádio e televisão do Paraná Aluizio Finzetto. Anteriormente, em Tupã Paulista, ao trabalhar numa gráfica vizinha de sua casa, aos 14 anos, escrevia para O Imparcial, semanário criado pelo dono da empresa.

Ainda muito jovem, já em Curitiba, no final dos anos 1960, começou a trabalhar como revisor no jornal O Estado do Paraná, com expediente das 11 da noite às cinco da manhã. Depois, foi ser repórter da sucursal de Curitiba da Última Hora, jornal criado por Samuel Weiner, cobrindo fatos do Palácio Iguaçu e da Assembleia Legislativa. O trabalho sempre bem feito levou-o a São Paulo para coordenar a finalização da edição paranaense da UH, que lá era impressa. Em determinado momento, com a ida de vários jornalistas da UH para recém-criados veículos da Editora Abril, Mussa foi convidado pelo próprio Weiner para ser o secretário de redação da edição nacional do jornal. Isso aos 21 anos.

O último encontro: amigos do Mussa reunidos em almoço em sua chácara, em dezembro de 2013. Ao lado de Mussa, o jornalista João Feder, diretor geral d’O Estado por décadas/foto: Orlando Kissner

Com a mãe viúva morando em Curitiba, Mussa resolver voltar à capital paranaense, reingressando em 1965 a’O Estado do Paraná, que passou a dirigir a convite do proprietário, o governador Paulo Cruz Pimentel. Ali, aplicando ensinamentos recebidos no convívio com Clara Conti, responsável pelo atraente visual da UH, e com o suporte da própria Clara, introduziu em O Estado uma reforma gráfica revolucionária.

Mussa dirigiu O Estado por cerca de 25 anos, afastando-se temporariamente para assumir o cargo de secretário de Estado da Comunicação Social em período do governo Álvaro Dias. Mais tarde, dirigiu o Correio de Notícias, além de ter sido jornalista da sucursal de Curitiba de O Estado de São Paulo, correspondente da Associated Press e professor dos cursos de jornalismo da PUCPR e da UFPR.

Casado com Guiomar Zerbeto Assis, Mussa foi pai de seis filhos: Marcelo, Rodrigo, ambos engenheiros, Erica, médica veterinária, Fernanda, juíza, Francisco, jornalista, e Cláudio, advogado. Vários sobrinhos trabalharam ao lado dele em diferentes funções n’O Estado. Sua maior alegria era reunião da grande família em torno da boa mesa árabe em sua chácara em Colombo, cidade vizinha de Curitiba, cuja casa e outras dependências foram por ele praticamente erguidas.

Deixou um grande e respeitado legado apesar de sua breve vida terrena.

(As informações do texto foram extraídas de depoimentos de Mussa ao programa Persona, da TV da UFPR, e ao Memória Paranaense, da Uninter, além das registradas no convívio diário, por bons anos, deste escriba com o seu diretor de redação.)

 

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